Rede de Estudos
Rurais,“Os saltos do ‘canguru’ nos canaviais alagoanos’’ mostra
que os trabalhadores são moradores da periferia das cidades
próximas às usinas e migrantes do sertão do Estado.
Revela também que
eles são jovens e que, com a política de produção máxima com o
mínimo de funcionários, não há mais mulheres no serviço.
“Por conta
dessas transformações, esse grupo selecionado é dotado de
habilidade e resistência física máxima para atingir as
elevadíssimas metas de produção. Nesse contexto de
intensificação do trabalho, só permanece empregado quem é capaz
de cortar, no mínimo, 7 toneladas diárias de cana”, explicou o
sociólogo.
PESAGEM
- Durante o estudo, o pesquisador entrevistou cerca de 60
trabalhadores das várias usinas de Alagoas e descobriu que a
jornada de trabalho dura cerca de 11 horas. Verificou também que
cada cortador ganha R$ 6,72 por tonelada e que as pesagens
realizadas pelas empresas são fraudadas.
“No caso do
corte da cana, o trabalhador não detém o controle exato da
quantidade produzida. Isso porque, além da imprecisão na medição
dos metros de cana cortados, ainda ocorrem fraudes no cálculo de
conversão para toneladas. Essas fraudes, que são recorrentes,
diminuem a quantidade que efetivamente foi cortada e rebaixam
ainda mais os salários”, observou.
CONSEQUÊNCIAS
- A tese aponta diversas sequelas do excesso de trabalho entre
os cortadores de cana. Além do cansaço físico, há o impacto
psicológico, já que muitos trabalhadores são descartados
precocemente pelas usinas. Esse fator, segundo o pesquisador,
gera o sentimento de vergonha e um desejo dos cortadores de
provar que não são preguiçosos ou vagabundos, o que leva a um
acúmulo ainda maior de trabalho. A consequência, muitas veze, é
o adoecimento.
“A luta pelo
reconhecimento do nexo causal entre o trabalho e o adoecimento
se faz urgente, e não tem como essa luta ser vitoriosa sem
mudanças profundas na forma de trabalho que gera o adoecimento",
defendeu Verçosa.
Entre todos os
danos, o pior é o quadro de cãibras por todo o corpo, conhecido
em Alagoas como ‘canguru’, ou ‘birôla' entre os paulistas. A
vítima encolhe os braços junto ao tronco, uma posição semelhante
à do animal, e em muitos casos as cãibras podem atingir a
língua, dificultando o pedido de socorro.
“Na medicina,
esse quadro é denominado distúrbio hidroeletrolítico e está
relacionado à desidratação, perda de eletrólitos e de sais
minerais provocados pela alta intensidade do trabalho e pela
longa jornada laboral sob o sol escaldante. Se o distúrbio não
for tratado a tempo, em alguns casos, pode levar à morte súbita.
É comum encontrar cortadores de cana recebendo soro na veia após
o trabalho. Apesar de o 'canguru' fazer parte do cotidiano nos
canaviais, ele é praticamente desconhecido fora dos eitos, e
esse ocultamento contribui para que o mesmo continue existindo”,
disse Verçoza.
MECANIZAÇÃO DO
SETOR -
A mecanização da colheita da cana é outro ponto levantado na
pesquisa. O processo, de acordo com Verçoza, está causando
apreensão entre os trabalhadores. Para eles, a chegada das
colheitadeiras pode representar o desemprego, mais um motivo
para mostrar capacidade.
“É preciso
mencionar que o processo de mecanização não é homogêneo. Nos
canaviais paulistas, por exemplo, ele encontra-se muito mais
disseminado do que em Alagoas”, contou, finalizando que mesmo
com a ampliação da mecanização a ‘superexploração’ pode
continuar.
*Fonte:
G1/São Carlos, sob a supervisão de Stefhanie Piovezan (Fotos:
Lúcio Verçoza / Jaqueline Souza)
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